sábado, 27 de março de 2010

Osnofa, a bola da vez


Um pouco de história

Em 2004/2005 gravamos de forma independente e a duras penas, com recursos angariados no velho, bom e infalível sistema do “ação entre amigos”,  o CD “Tião”, do cantor e compositor Raberuan. 


Lembro que na época incomodamos e até constrangemos os amigos utilizando todos os instrumentos que tínhamos na mão para levantar grana para o “Tião”, desde venda antecipada de CDs e promoção de pré-lançamentos, passando pelas fatídicas rifas de DVDs e máquinas fotográficas e, inclusive, promovendo na maior cara de pau a ressureição do livro de ouro, onde tomamos o cuidado de colher primeiro as assinaturas e os valores dos mais endinheirados para intimidar os próximos da fila, tudo por uma boa causa – o registro do trabalho do Raberuan.

Lembro comovido, como se fosse hoje, um monte de amigos que compraram de prima a idéia e lançaram-se de olhos fechados na empreitada, não medindo tempo nem esforços, cada um dentro do tamanho da sua possibilidade. Amigos como Gerson Sadao Miyoshi, Edsinho Tomaz de Lima, Luis Casé, Wilson André Filho, Celso Frateschi, Mizão e Mizinho de Carvalho, Domenico Tinelli, Robson Martins, Walter Passarinho, Mario Landim, Ronaldo Ferro, Valdir Aguiar, Gilson Passos, Heron Alcantara, Cida Arizona e Sueli Kimura.

Em 2009 gravamos o CD “Sacha, 60”, também de forma independente, que teve por mote principal a comemoração dos 60 anos de idade do poeta de São Gabriel – BA,  que chegou há 40 anos em São Miguel Paulista para ajudar a plantar aqui a semente de um dos mais importantes movimentos de arte e cultura popular do país. Já a produção do “Sacha, 60”, contou com a participação de outros amigos como Cleston Teixeira, Silvio Kono e André Marques que juntaram-se ao núcleo inicial que realizou o CD “Tião”, isso sem contar o apoio e a participação de toda a comunidade artística e cultural da região que cantou a obra do poeta no CD.

Lembro que foi no calor da gravação do CD “Tião” que formatamos, eu, Raberuan e Sueli Kimura, os conceitos básicos do Projeto Criação de Memória, para promover o resgate e o registro da riquíssima obra musical produzida desde os anos 1970 na região de São Miguel Paulista, que é um celeiro abençoado de poetas, compositores e músicos/grupos musicais de muito talento que, por força dos mais diferentes impedimentos, não conseguem registrar e veicular os seus trabalhos. De cabeça cito alguns dinossauros: Gildo Passos, Eliel Lima, Luis Casé, Grupo Ururaí, Tião Baia, Líder’s do Chorinho, Osnofa, Betinho Rios e Ronaldo Ferro. Da nova geração lembro dos talentosíssimos Rodrigo Marrom, Claudemir “Dark’ney” Santos, Vinícius Casé, Caio Vandré, Tarcisio Hayashi, Carlão + um Guerreiro da Leste, Nando Z, Ivan Néris e Tiago Araujo.

Alguns artistas como Edvaldo Santana, Zulú de Arrebatá, Jocélio Amaro, Sacha Arcanjo e Ceciro Cordeiro, uns menos e outros mais, ainda conseguem romper o muro de impossibilidades que separa o existente do registrado. No mais o que existe é uma grande obra musical e poética produzida há décadas na região, que está esquecida e condenada ao desaparecimento ou à espera de um projeto que estruture mecanismos que promovam o registro, disseminação e consumo dessa obra.

Durante a realização do “Sacha, 60” conseguimos costurar e resumir em alguns pontos os objetivos do Projeto Criação de Memória Artística e Cultural na Região de São Miguel Paulista: 
  • Promover o resgate e o registro dos trabalhos poéticos e musicais existentes na região utilizando as formas convencionais no mercado, como CDs, DVDs, livros, clip’s, documentários e outros;
  • Promover a disseminação das obras registradas utilizando os instrumentos existentes no mercado, como shows, palestras, audições, saraus, internet e outros;
  • Promover na região, de forma organizada e sistemática, a criação de público consumidor para as obras registradas, por meio da realização de eventos específicos para esse fim (shows, palestras, audições, saraus e outros), em escolas, teatros, casas de cultura, bibliotecas, faculdades, entidades sociais e religiosas, associações de bairro, bares, logradouros públicos e outros.

Atualmente o Criação de Memória está sendo formatado por Cleston Teixeira, Raberuan, Sueli Kimura e Akira Yamasaki e um dos objetivos principais com o projeto é captar recursos para a gravação de uma dúzia de CDs que contemplem o registro da obra musical e poética existente na região de São Miguel Paulista, a sua disseminação e também, a criação de um mercado consumidor para essa obra registrada. 

Mas não é porque o projeto ainda não existe e nem existem os recursos financeiros à disposição, que temos que ficar parados na praça dando milho aos pombos e esperando a banda passar. Conseguimos realizar com muitas dificuldades, o “Tião” e o “Sacha, 60”, e não podemos deixar a poeira baixar, o feijão esfriar. 

Osnofa, a bola da vez

Temos que continuar com o projeto. A bola da vez é o cantor e compositor Osnofa, um poeta popular que morou a sua vida inteira de mais de 60 anos na Vila Jacuí, na mesma batcasinha de sempre. Não menos genial que os já focados Raberuan e Sacha, Osnofa reproduz com uma sonoridade particular, ora popular ora erudita, ora alegre, debochada, irônica, ácida e amarga, e ora séria, sisuda e severa, em suas letras e músicas, um universo único e singular de referencias culturais.

Fundador e participante do Movimento Popular de Arte nos 1970 e 1980, Osnofa sintetiza em seu balaio de circunstâncias e influencias, que vão do rock ao chorinho, passando pelo samba, pop, maxixes, baião e outro, até sua experiencia como baixista e crooner de conjuntos de baile, a simplicidade do seu dia a dia nas Jacuís da vida, que é igual à Curuçá, ao Robrú, à Sinhá, Nitro-Operária, Romano, Helena e tantas outras.

A idéia dessa vez é efetuar o registro da obra única e incomparável do poeta, cantor e compositor Osnofa, e tirar do limbo canções extraordinárias como Último Reduto, Crepúsculo, Agamelanciou, Boleramba de Breque e Zé Neguinho, para ficar em alguns exemplos, que comovem apenas a um círculo restrito de ouvidos privilegiados. 
Na última 6ª feira - 26/03/2010, demos o pontapé inicial para a gravação do CD do Osnofa no Musical em Mi Estúdio, com previsão de finalização do trabalho em agosto de 2010. 

Akira Yamasaki.




quinta-feira, 4 de março de 2010

Que bom que você veio, Sacha.


Na madrugada incerta e nos arredores relativos do Bar do Wlad, no centro de Ermelino, vampiros sonolentos estreavam a primeira garoa paulistana de 2010, observando e medindo desinteressados, incautas jugulares que pulsavam suavemente etílicas. Que bom que você veio, Sacha, o chuvisco parecia sussurrar.
Já passava das quatro da manhã do sábado, 27/02, quando saí do bar, um pé depois do outro, os cabelos molhados pelo sereno e esgueirando-me por entre roqueiros e vampiros vestidos de preto, devidamente escoltado pelos anjos Sueli Kimura, Célia Cabelo e Sacha Arcanjo.
É verdade que eu estava melanciado ao extremo e esgotado pelo cansaço, mas de alma leve e lavada pela chuva do dever cumprido, voando na sensação de ter participado nos últimos quatro meses de um projeto essencial – o CD Sacha, 60.
Alguns gatos pingados renitentes ainda insistiam nas últimas saideiras, lembro vagamente de ter cumprimentado na saída o Jorge Gregório, o Raberuan e a Cláudia, o Edvaldo Santana, o Heron Alcântara e o Edsinho Tomaz enquanto procurava desesperado as chaves do carro. Lembro que haviam outros mas a minha memória não consegue fixar nome ou imagem de ninguém porque vai e vem como ondas do mar.
A ficha caiu no dia seguinte quando acordei e vi as fotos do evento salvas por Sueli Kimura. Elas revelaram que a Festa de Lançamento do CD Sacha, 60, foi um momento raro de integração que celebrou a amizade e a alegria por meio da história de um poeta genial que chegou em São Miguel Paulista há quarenta anos atrás, vindo da Bahia, para plantar aqui a semente de um dos mais importantes movimentos de arte e cultura popular desse país.
Que bom que você veio, Sacha, as fotos parecem gritar.

Akira Yamasaki.